segunda-feira, 16 de junho de 2008

O horror do vazio

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"Faz muito tempo que não vos falo. Mas este título fez-me secura nos olhos. Talvez porque nas últimas semanas eles têm chorado tanto ao verem o verdadeiro HORROR DO VAZIO. Encontro-me neste momento, no centro da "Europa Civilizada", onde apesar dos teclados não terem acentos, a arquitectura se impõe no tempo e o gótico nos trás à memória histórias de reis e princesas, onde existe espaço para as árvores, jardins e prisões de 40 andares de estilo contemporâneo. Mas garanto-vos gente da minha terra, que este sim é o verdadeiro horror do vazio. Estou sob um contrato de silêncio que não me permite mencionar nomes nem de empresas, países ou pessoas, mas não tenho um contrato de silêncio para o horror a que tenho assistido aqui. O Presidente da Comissão para os refugiados fala a mesma língua que nós, mas nem com ele posso desabafar. Estou a receber o ordenado mínimo de um país europeu para limpar as "cubatas" dos refugiados que aqui sao recebidos "generosamente" por este povo. Acreditem que nem durante a guerra por aí vi a minha gente viver assim.
Vêem com a esperança de vida e força para lutar pela dignidade dum trabalho, com a promessa de algum dinheiro semanal para os primeiros tempos, e têem a garantia de integração social e de poderem vive sem medo da guerra, sem medo da seca ou sem medo de sistemas políticos. Chegam sem nada e sem nada continuam. Sobrevivem com cerca de 40 Euros por semana num país em que uma refeição pode custar 15 Euros.
Assisti à preparação de uma refeição que uma mãe fazia com todo o carinho para ela e para a filha de quatro anos, a base desse jantar eram duas pequenas lulas e um bife de frango e tive o desplante de perguntar se chegaria para as duas! A resposta daquela mãe foi elucidativa da situação, aquele era o jantar desse dia e o almoço do dia seguinte. até serem de novo repatriadas para os seus paises, onde a única diferença é a água potável e as vacinas. Por aqui não se alimentam melhor, porque a cozinha que normalmente serve 12 pessoas é um vazio horrível. Sempre que entro num desses aposentos miseráveis grito quase calada por um patrício, e vou pedindo a Zambie que não haja resposta, que nao esteja ali um Angolano. Oiçam o meu pedido: nao destruam o edifício dos Correios nem percam o espacos vazios! Ocupem-nos para morar com alguma dignidade humana, porque aqui, no centro da "Europa civilizada", não há espaço, apenas dinheiro para os que cá moram, e só para alguns, porque nunca ninguém nos vai dar nada sem ter o dobro em troca. Daqui, do horror do vazio vos suplico, amem o nosso espaço, porque aqui chove e faz muito frio e aqui sim, dormir numa cubata ou na rua, é sempre morar no HORROR DO VAZIO.
A vossa,
Ana"

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